Que acontece no último terço do filme A Estrada (The Road), de John Hillcoat, baseado no romance de Cormac McCarthy? Dir-se-ia que a parábola filosófica sobre um pai e um filho em cenário apocalíptico se desmancha, dando lugar a uma tipificada aventura de sobrevivência em que a "reconstituição" da família emerge como escape dramático e moral... Provavelmente, o filme reflecte as atribulações da sua produção (como todos, hélas!) e, nem que seja por reacção de defesa, não consegue sustentar de forma dramaticamente coerente aquilo que o coloca em marcha. A saber: o esvaziamento de qualquer réstea de sagrado, ou ainda, o total cepticismo face ao conceito de humanidade.Seja como for, A Estrada deixa-nos algo de cinematograficamente precioso, por assim dizer o anti-2012 [Emmerich]. Assim, em vez de um cataclismo digital, reduzido ao look pueril de um banal jogo de video, este é, insolitamente, um filme sobre o retorno do material [contra o virtual]. O espantoso trabalho da equipa cenográfica — Chris Kennedy (production design), Gershon Ginsburg (art direction) e Robert Greenfield (set decoration) — vai, todo ele, no sentido de reforçar uma intensa verdade das paisagens, dos objectos e, em particular, de tudo aquilo que é detrito ou ruína. Dir-se-ia que reencontramos, aqui, a paixão do real que perpassa também por O Sítio das Coisas Selvagens. Ou como algum cinema americano quer, literalmente, descer à terra.
fonte: http://sound--vision.blogspot.com/
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